Quando se fala em câncer, imediatamente começamos a pensar
em algumas coisas - diagnóstico precoce, luta pela vida e busca incansável por
novas terapias.
A ciência continuamente tenta encontrar pistas para melhor caracterizar esta terrível doença. Um aspecto extremamente interessante e que merece atenção de todos nós é a correlação entre o comportamento dos nossos batimentos cardíacos e o câncer.
Precisamos lembrar, primeiramente, que o câncer, em linhas gerais, representa um processo inflamatório intenso associado ao descontrole da multiplicação das células. Para ficar mais fácil de entender, o câncer se instala em um determinado órgão de tal forma que as células deste órgão, anteriormente saudáveis, começam a se multiplicar de acordo com um ritmo “estranho” e agressivo. Dali em diante, o controle da doença tende a ficar cada vez mais difícil.
Esta mudança no comportamento das células de um certo órgão acarreta repercussões em outras partes do corpo e também em parâmetros vitais para nossa saúde, como a pressão arterial e os batimentos cardíacos. Possivelmente muitas mudanças metabólicas podem ser desencadeadas por um câncer, promovendo sobrecarga e estresse ao trabalho do coração.
Todos nós, ao longo de um dia comum, apresentamos uma certa variabilidade de batimentos cardíacos. Algumas condições interferem nesta variabilidade, como o frio, calor, sensação de dor, sensação de fome, estado de ansiedade, irritabilidade e os níveis de poluição atmosférica. Dessa forma, é considerado normal que uma pessoa conviva com elevações e quedas dos batimentos cardíacos ao longo do mesmo dia.
Alguns tipos de câncer, como câncer de pulmão, câncer de intestino e câncer de pâncreas podem, ao longo de seu curso natural, provocar mudanças mais repentinas e mais acentuadas nos batimentos cardíacos e este cenário passa a ser altamente indicativo da evolução e prognóstico destas doenças.
Em geral, quando acompanhamos uma pessoa que está lutando contra um câncer, a tendência é focar na aparência física, no emagrecimento, na perda de massa muscular e em alguns sinais ou sintomas muito comuns como falta de ar, febre e perda de apetite. No entanto, cada vez mais tenho sido estudada esta relação entre os batimentos cardíacos e o câncer. Muitos estudos têm demonstrado que, quando os batimentos cardíacos atingem níveis muito elevados e permanecem nesta condição por tempo indeterminado, o prognóstico do câncer tende a não ser favorável.
Quando a frequência cardíaca se estabelece em níveis elevados por tempo prolongado, ocorrem alterações no funcionamento de outros órgãos - acúmulo de líquidos nos pulmões (“água” nos pulmões), declínio mental (comprometimento da memória e do raciocínio) e redução progressiva da diurese. Vejam que esta mudança nos batimentos cardíacos, causada pela atividade inflamatória de alguns tipos mais agressivos de câncer, pode abreviar significativamente o tempo de sobrevida.
Estes três tipos de câncer citados - pulmão, intestino e pâncreas, quando não diagnosticados de forma precoce, costumam exigir tempo prolongado de quimioterapia. Não bastasse isto, estes tumores comprometem o equilíbrio alimentar, não somente por afetar nossa flora intestinal, mas também por liberar toxinas que causam muita perda de apetite. A quimioterapia consiste em um tratamento eficaz, mas também tóxico, podendo contribuir para a cardiotoxicidade, ou seja, efeitos tóxicos dos medicamentos quimioterápicos no músculo do coração.
O impacto do câncer em nossa flora intestinal e qualidade alimentar, juntamente com os efeitos tóxicos da quimioterapia, acaba causando anemia também, a qual é mais um mecanismo que favorece a elevação dos batimentos cardíacos. Esta anemia pode ocorrer pelo fato de o câncer provocar hemorragias, por mudar a absorção intestinal dos nutrientes e por causar perda de apetite com redução do aporte de ferro para nosso organismo.
A radioterapia pode ser um outro tipo de tratamento para o câncer, como no caso de um câncer de pulmão mais agressivo. Este tipo de radiação pode causar pequenas queimaduras nos tecidos e, no caso da radioterapia para câncer de pulmão, o coração acaba sendo comprometido também. Estes efeitos da radiação inflamam o músculo cardíaco (miocárdio), causando uma miocardite, a qual pode cursar com falência aguda ou crônica do coração. Este tipo de miocardite pode manter os batimentos cardíacos elevados também por tempo indeterminado.
Para finalizar esta discussão sobre o impacto do câncer no comportamento dos batimentos cardíacos, vale acrescentar que é muito natural que quadros depressivos estejam presentes desde o diagnóstico do câncer e durante todo o tratamento. Quem enfrentou ou está enfrentando uma depressão, sabe que constantemente ocorre elevação dos batimentos cardíacos e sintomas associados como falta de ar e perda de apetite.
Sempre que alguém é diagnosticado com câncer, a vida desta pessoa muda completamente.
São muitas sensações reunidas em um único corpo - medo, apreensão, dor, cansaço e coração acelerado. Este último deve ser muito bem acompanhado, pois tem importância durante o tratamento, especialmente para melhor compreensão do prognóstico. Lutar contra o câncer também é vigiar os batimentos cardíacos ao longo de todo o processo.
Prof. Dr. Edmo Atique Gabriel
Cardiologista e Cirurgião Cardiovascular
Professor Livre–Docente
CRM 105226
www.instagram.com/edmoagabriel/ (@edmoagabriel)
https://coracaomoderno.com.br/
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